6 de janeiro de 2010

Carta Para Longe, Para Onde A Vista Não Alcança


Porto Alegre, 2 de Abril de 2007

            Oi amor, o que tu anda fazendo? Já fazem algumas semanas desde a última carta, eu fico apreensivo... Onde tu foi não há telefone, internet, só nos restou o papel. Tu foi pra longe, pra onde eu não posso te alcançar correndo, como fazia antes. A vida aqui segue a mesma, exceto uma coisa, que junto das chuvas e das saudades, é o motivo pelo qual te escrevo agora.
            É possível que tu não acredites. Eu mesmo não acreditaria se contassem, talvez nem mesmo se me mostrassem, é muito além da minha compreensão. Na verdade, essa coisa irreal, a tua ausência, essa primavera de flores grandes e coloridas, a saudade da tua voz, tudo anda contribuindo para que eu me sinta num sonho, do qual preciso desesperadamente acordar.
            Essa coisa começou faz pouco tempo, uns cinco dias, talvez mais. Não tenho certeza, ando perdido. A primeira vez me assustou de maneira que cheguei a achar que estava delirando. Mas logo depois aconteceu de novo. E de novo. E de novo. A freqüência dos acontecimentos venceu meu ceticismo pela exaustão. Aprendi a conviver com o absurdo, e agora toda a vez que uma delas vem, eu paro e ouço o que tem a me dizer. Não acredito em suas palavras, mas acredito que estou ouvindo-as.
            Sinto vontade de te perguntar se isso já lhe ocorreu. Não, provavelmente não. Certamente não, mas sinto vontade de perguntar mesmo assim. Sinto falta de saber coisas sobre a tua vida, mesmo as mais insignificantes. Acho que vou perguntar a uma delas quando tu volta. Mas elas não devem saber, nem tu sabe... Elas conhecem minhas dores e dúvidas e anseios e acho extremamente curioso me envolver tanto com essas borboletas.
            Elas costumam vir no fim da tarde, quando estou sentado no quintal, perto do jardim. Não é comum vir mais de uma por vez, mas isto já ocorreu. O normal (acho insano usar a palavra “normal” quando falo sobre isso) é vir apenas uma delas, de cor viva e quase fluorescente, voar em círculo perto da minha cabeça e acabar pousando logo acima da minha orelha. Então ouço uma voz reverbando dentro do meu ouvido, uma voz feminina, mas grave, que fala com um tom ao mesmo tempo urgente e sábio. Cada borboleta possui uma voz diferente, embora elas se assemelhem. Eu as deixo monologarem, sem interferir de qualquer modo. Me dão conselhos. É freqüente me dizerem que tu já não me ama... Como falei, não acredito em nada que dizem, mas não deixo de sentir o peito apertar. Não sei porque, afinal são insetos, não há motivos pra me falarem essas coisas, embora as falem diariamente.
            Guria vem logo que já não agüento acordar sem tem perspectivas de te ver. Diz-me, pro favor, quando tu volta, até gosto de surpresas, mas quero preparar algo pra tua chegada, e também acho que o sofrimento passa mais rápido (embora ainda lentamente) se tem data certa para acabar. Ah, ia me esquecendo... fiz uma música pra ti um dia desses. Eu gostei dela. As borboletas me falaram que ficou boa, mas que tu não vai querer ouvir. Eu espero que vá. Paro a carta por aqui, apesar de poder escrever livros pra ti, acho cartas longas enfadonhas. Te amo, amor, faria de tudo pra arrancar essa distância que se infiltrou entre nós.

                                                                    Ansiosamente
                                                                Daquele que te espera...

2 comentários:

  1. Ainda bem que eu já voltei :3 haha

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  2. Mas ficou lindo e triste também, de certa forma. Acho que ela foi pra nunca mais voltar...

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